A recente decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de bloquear R$ 6 bilhões do programa Pé-de-Meia passou a ser defendida pela oposição como o mais novo motivo para o impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
As manobras do governo para pagar uma bolsa mensal de R$ 200 para estudantes do ensino médio já ganharam a alcunha de novas “pedaladas fiscais”, apelido dado aos artifícios contábeis que levaram à deposição da ex-presidente Dilma Rousseff em 2016
Os dois casos se aproximam porque gastos do governo foram, lá e cá, efetuados fora do Orçamento e, portanto, sem aprovação do Congresso e transparência, o que impede não apenas o controle da despesa, mas também sua adequação aos limites fiscais.
O contexto político e econômico também se assemelha, marcado por deterioração do apoio no Congresso ao PT, crescente desconfiança do mercado com o equilíbrio das contas públicas e piora do poder de compra da população.
No caso de Dilma, as pedaladas fiscais consistiram em atrasar pagamentos de empréstimos crescentes tomados de bancos públicos para financiar despesas correntes do governo, de forma oculta. Com isso, o governo escondia o rombo nas contas públicas. Segundo a sentença do impeachment, em 2014, ano da reeleição de Dilma, a dívida pública federal foi subdimensionada em R$ 40,2 bilhões; em 2015, o passivo cresceu e chegou a R$ 58,7 bilhões.
O truque foi revelado, na época, em reportagens do jornal “O Estado de S. Paulo”, e depois foi confirmado na análise de contas feita pelo TCU. O relator do processo foi o ministro Augusto Nardes, o mesmo que agora bloqueou os recursos do Pé-de-Meia, desta vez a partir de informações levantadas pelo UOL, também corroboradas pelos técnicos do tribunal.
O que fez o governo no Pé-de-Meia
Para depositar R$ 200 por mês para alunos do ensino médio, via Caixa Econômica Federal, o governo constituiu um fundo privado, chamado Fipem (Fundo de Incentivo à Permanência no Ensino Médio). Esse fundo, por sua vez, é abastecido com recursos de outros fundos controlados pelo governo, no caso:
- superávits financeiros do Fundo Social (que recebe dinheiro oriundo da venda de petróleo);
- verbas do Fundo de Garantia de Operações de Crédito Educativo (Fgeduc), criado em 2009 como avalista de empréstimos tomados por estudantes do ensino superior no Fies; e
- dinheiro do Fundo Garantidor de Operações (FGO), também criado em 2009, originalmente para garantir parte do risco dos empréstimos para micro, pequenas e médias empresas, microempreendedores e profissionais liberais.
O TCU verificou que, para pagamentos feitos em 2024, o Pé-de-Meia usou R$ 6,1 bilhões reservados no Orçamento de 2023 para o Fundo Social (o que contraria o princípio da anualidade orçamentária); e mais R$ 6 bilhões do Fgeduc. Este último valor, no entanto, foi transferido diretamente para o Fipem, sem passar pelo Tesouro e sem previsão no Orçamento de 2024. Ou seja, este montante não foi aprovado pelo Congresso.
Para os auditores do TCU e consultores do Congresso, os R$ 6 bilhões do Fgeduc, por se destinarem a um programa de bolsas administrado pelo Ministério da Educação, deveriam fazer parte do Orçamento. Sem isso, essa despesa do Pé-de-Meia contornou o Arcabouço Fiscal criado pelo próprio governo Lula e ainda driblou as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal. Ou seja, foi feito um gasto fora dos limites autorizados, disfarçando o aumento da dívida pública.
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